A Justiça de São Paulo manteve aberta uma ação de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado contra o vice-presidente Geraldo Alckmin por receber R$ 8,3 milhões de doação eleitoral não declarada da construtora Odebrecht nas eleições de 2014. À época, ele buscava a reeleição ao governo pelo PSDB. Outras cinco pessoas são acusadas de improbidade. Em 2020, a Odebrecht passou a se chamar Novonor.
O QUE ACONTECEU
Em decisão de 19 de julho publicada no dia 25, a juíza Luíza Barros Roza Verotti, da 13ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, rejeitou pedido para trancar a ação com base na anulação das provas do acordo de leniência da Odebrecht e das delações dos ex-executivos da empresa assinados na Lava Jato. A informação foi publicada antes pelo portal Metrópoles, e confirmada pelo UOL, que teve acesso aos autos.
Segundo a juíza, a ação de improbidade se baseia num inquérito civil aberto pelo MP-SP em 2018 do qual constam depoimentos de ex-diretores da Odebrecht e planilhas de pagamento sem "nenhuma relação" com as que estão nos autos das ações da Lava Jato.
Os documentos foram entregues ao MP-SP pelo ex-diretor financeiro da construtora Álvaro Novis, pelo ex-auxiliar administrativo de uma corretora de valores chamado Rogério Martins e pela transportadora de valores Transmar.
"Os elementos probatórios constantes do inquérito civil são imunes de contaminação, uma vez que não têm nenhuma relação, seja direta, seja por derivação, com o acordo de delação premiada", escreveu a juíza, na decisão.
Além de Alckmin, respondem à ação Marcos Monteiro (ex-diretor da Imprensa Oficial de São Paulo e tesoureiro da campanha de Alckmin ao governo de São Paulo em 2014) e os ex-executivos da Odebrecht Luiz Antônio Bueno Júnior, Benedicto Barbosa da Silva Junior, Fernando Migliaccio e Hilberto Mascarenhas Alves da Silva.
O vice-presidente chegou a ter R$ 9,9 milhões bloqueados para garantir o pagamento da multa caso fosse condenado, mas a medida foi suspensa em junho deste ano.
Em nota enviada à reportagem, a defesa do vice-presidente Geraldo Alckmin, conduzida pelos advogados Fábio de Oliveira Machado, Marcelo Martins de Oliveira e José Eduardo Alkmin (grafia diferente, ele não é parente do vice-presidente), disse que os fatos discutidos na ação "já foram objetos de reiteradas decisões judiciais, inclusive do Supremo Tribunal Federal há mais de um ano, e jamais prosperaram".
"Em relação ao vice-presidente Geraldo Alckmin não há fatos que subsistam e a Justiça paulista, como confiamos, em breve tempo determinará a extinção desse processo judicial."
O advogado de Marcos Monteiro, Guilherme Corona, afirma que todas as provas colhidas no processo são ilegais e que trabalha pela extinção da ação.
Em nota, ele afirmou o seguinte: "Atendendo a pedido da defesa de Marcos Monteiro, o Supremo Tribunal Federal acolheu pedido por ele formulado em Reclamação Constitucional e determinou ao d. juízo de primeira instância, em que se processa ação de improbidade administrativa, que retirasse do processo a totalidade das provas nulas ali existentes e que fosse proferida decisão acerca da viabilidade do prosseguimento da ação. Entende a defesa que todas as provas existentes no processo são ilícitas de forma direta ou por derivação de modo que está ajuizando os recurso cabíveis demonstrando tais fatos e objetivando o reconhecimento da ilicitude da totalidade dos elementos constantes do processo e a pronta extinção da ação em razão da inexistência de qualquer justa causa para seu prosseguimento."
HISTÓRICO
A ação foi aberta em 2018 com base no acordo de leniência da Odebrecht e nas delações premiadas de ex-executivos da empreiteira. O MP-SP afirma que a campanha de Alckmin ao governo de São Paulo em 2014 recebeu R$ 8,3 milhões da Odebrecht sem informar à Justiça Eleitoral.
Entre as provas usadas para a abertura da ação estão os sistemas Drousys e MyWebDay, utilizados à época pela empreiteira. Um era um programa de troca de mensagens, e o outro, um ambiente virtual onde estavam registrados os pagamentos de propina.
Em março de 2023, o então ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), anulou as provas produzidas pelo acordo de leniência e pelas delações. Segundo ele, o ex-juiz Sergio Moro (nesta terça-feira (6) senador pelo União Brasil), que assinou o acordo de leniência com a Odebrecht, não tinha competência para julgar o caso.
Uma semana depois, Marcos Monteiro, ex-diretor da Imprensa Oficial de São Paulo e tesoureiro da campanha de Alckmin em 2014, pediu ao Supremo que também trancasse a ação de improbidade.
O pedido foi atendido em parte pelo ministro Dias Toffoli, do STF, que se tornou relator da ação depois da aposentadoria de Lewandowski. Toffoli proibiu a Justiça de São Paulo de usar as provas decorrentes dos sistemas Drousys e MyWebDay, mas não trancou a ação.
Marcos Monteiro, então, pediu à juíza Luiza Verotti que trancasse a ação de improbidade, já que, segundo ele, a acusação se baseia apenas nas informações dos sistemas da Odebrecht.
A magistrada negou, argumentando que essa avaliação seria feita "no momento da sentença" - o caso ainda não foi julgado.
Diante de novo pedido de Marcos Monteiro, a juíza proferiu a decisão de 19 de julho: as provas decorrentes dos sistemas da Odebrecht não seriam usadas, mas as informações do inquérito civil poderiam ser usadas, já que ele não foi "contaminado" pelas decisões do Supremo.
A ACUSAÇÃO
De acordo com o Ministério Público, a Odebrecht doou a duas campanhas de Alckmin para o governo de São Paulo: R$ 2 milhões na campanha de 2010 e R$ 8,3 milhões, na de 2014. Ambas foram vencidas pelo nesta terça-feira (6) vice-presidente. A ação de improbidade, no entanto, se refere apenas ao dinheiro recebido em 2014.
Segundo as investigações, o dinheiro foi entregue em duas ocasiões por um auxiliar administrativo de uma corretora, a um "portador" indicado por Marcos Monteiro e era destinado à campanha para a reeleição de Alckmin. As entregas aconteceram no hotel Mercure Privilege, em Moema, zona sul de São Paulo.
O MP-SP afirma na petição inicial que o pagamento serviu para garantir que a Odebrecht assinasse contratos com o governo do estado para a construção da Linha 6 do Metrô.
No entanto, em depoimentos à Justiça de SP, os ex-funcionários da Odebrecht Luiz Bueno e Benedicto Júnior disseram que o dinheiro tinha "relação direta" com diversas obras do governo paulista, e não apenas a do metrô. E que os pagamentos faziam parte de uma política da empresa de manter "boas relações" com candidatos a governador em estados considerados de interesse pela construtora.
Segundo a juíza Luiza Verotti, "ao que tudo indica, a Construtora Norberto Odebrecht desenvolveu, durante anos, vultoso esquema de corrupção, efetuando pagamento de propinas e doações eleitorais não contabilizadas a candidatos a mandatos eletivos com intuito de ser beneficiada em licitações, contratos e parcerias público-privadas fraudulentos".
O QUE DIZEM OS ACUSADOS
Com tese similar à da defesa de Alckmin, o advogado Guilherme Corona, que defende Marcos Monteiro, também sustenta que todas as provas colhidas no processo são ilegais e que trabalha pela extinção da ação.
Em nota, ele afirmou o seguinte: "Atendendo a pedido da defesa de Marcos Monteiro, o Supremo Tribunal Federal acolheu pedido por ele formulado em Reclamação Constitucional e determinou ao d. juízo de primeira instância, em que se processa ação de improbidade administrativa, que retirasse do processo a totalidade das provas nulas ali existentes e que fosse proferida decisão acerca da viabilidade do prosseguimento da ação. Entende a defesa que todas as provas existentes no processo são ilícitas de forma direta ou por derivação de modo que está ajuizando os recurso cabíveis demonstrando tais fatos e objetivando o reconhecimento da ilicitude da totalidade dos elementos constantes do processo e a pronta extinção da ação em razão da inexistência de qualquer justa causa para seu prosseguimento."
O advogado da empreiteira, Giuseppe Giamundo Neto, foi procurado, mas preferiu não dar declarações sobre a ação.